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Chamados a ser transformados à Imagem de Cristo (2 Cor 3,18)

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Reflexões sobre a Formação Monástica por D. Armand Veilleux, OCSO
[Texto de artigo publicado no A.I.M. Monastic Bulletin (nº 59) sobre o tema da formação monástica. Trata-se do curto sumário de um curso que dou no Collegio Sant’Anselmo em Roma a cada dois anos sobre o mesmo assunto. O artigo foi escrito em Francês, e a tradução inglesa publicada no A.I.M. Monastic Bulletin traiu o original em muitos locais. Eis a tradução revista que ao menos é mais próxima do original]

I. Imagem de Deus

omos criados à imagem e semelhança de Deus, mas feridos pelo pecado, precisamos que esta imagem seja restaurada dentro de nós. Este é o objetivo último da vida cristão e assim também, da vida monástica.
O Filho de Deus, que estava in forma Dei, não temeu renunciar a sua condição privilegiada; humilhou-se a si mesmo (Fil 2, 6-7), tornando-se um de nós, semelhante a nós exceto no pecado (Hb 4,15). Consentiu em perder sua forma, sua beleza. Desfigurou-se a ponto de não mais ser reconhecível (Is 53,2). Provou a morte. Mas o Pai o ressuscitou dos mortos e o fez sentar-se à sua direita, e o fez Kyrios (Fil 2,9). Deste modo, a nós foi mostrado o caminho de retorno à Imagem. Tendo sido deformados pelo pecado, precisamos reformar-nos de tal modo a ser gradualmente transformados na imagem do Cristo ressuscitado.
Esta transformação final, através de um longo processo de reforma, ou conversão, é o objeto da formação monástica. Esta formação deve ser entendida em primeiro lugar, não no sentido de uma atividade exercida por um formador humano sobre outra pessoa, mas no sentido de uma transformação gradual e constante, nunca plenamente realizada, de uma pessoa que, usando dos meios oferecidos pela conversatio monástica, permite ao Espírito Santo que restaure dentro de si a imagem desfigurada e a semelhança perdida.
O tema da Imagem de Deus é central na espiritualidade do monaquismo primitivo. Esta doutrina, que vem de Gen 1,26, é muito cara a todos os Padres da Igreja que se dedicaram a pesquisar o mistério da salvação. Cada um deles o fez de um modo diferente, mas com a liberdade que é encontrada entre poetas e místicos, e assim esta doutrina se tornou muito complexa e foi apresentada com sentidos com muito diferentes matizes. Pode ser resumida como se segue: O homem foi criado à imagem (imago) e à semelhança (similitudo) de Deus. Como criatura privilegiada, foi chamado a partilhar da vida divina. Estas condições foram revertidas pelo pecado, mas o homem retém a capacidade de se voltar para Deus (capacitas Dei). Mediante a graça da Redenção e em imitação de Jesus Cristo, o homem é capaz de participar na vida divina. Se sua predisposição para Deus (imago) se desenvolve e se manifesta numa vida contínua de virtude, move-se para a semelhança (similitudo) e acha sua realização em tornar-se a imagem de Deus.
Quando falamos de formação monástica, geralmente queremos dizer formação inicial. Esta, porém, pode ser considerada apenas um elemento ou estágio no processo total de transformação que acabamos de descrever. O objetivo da formação monástica, em todos os seus estágios, não é nada menos do que a restauração da imagem de Deus no monge. É uma transformação progressiva que engloba toda a vida. Para realizar esta caminhada de transformação, o homem tem um modelo, um protótipo: o Verbo, que é a perfeita Imagem do Pai, e que São Bernardo denominou de sacramentum salutis.
Nenhum dos Padres do monaquismo de fato escreveu sobre "formação" - ao menos no sentido que entendemos a palavra hoje. Entretanto, vemos de seus escritos que eles entendiam claramente que seu papel, quer como abades ou pais espirituais, era o de fazer nascer Cristo em seus discípulos. Sabiam que para levar esta tarefa à sua realização, deveriam levar seus monges à imitação de Cristo. Na verdade, é através da imitação de Cristo que o monge torna gradualmente mais ativa na sua vida esta semelhança que recebeu no momento de sua criação, e que a imagem de Deus dentro dele é restaurada.
A idéia segundo a qual alguém forma um outro na vida monástica, como se treina um doutor ou um professor, vem de uma concepção totalmente moderna. Esta abordagem era completamente estranha aos Padres do Monaquismo. Para eles, a vida monástica não era uma realidade em que alguém podia formar outrem, mas ao contrário, era um meio, ou melhor, um conjunto abrangente de meios, pelos quais uma pessoa permitia a outra ser formada. É vivendo a vida monástica que alguém se torna cada vez mais um monge e gradualmente permite a si mesmo ser transformado na imagem de Cristo.

II. No contexto cenobítico

Quando os anacoretas dos primeiros séculos foram para o deserto, buscavam pôr-se sob a direção de um pai espiritual que já tinha tido a experiência do deserto e que demonstrara a influência do Espírito em sua pessoa, uma pessoa que havia se tornado pneumatophoros. Este pai espiritual carismático do deserto passava sua própria experiência a seus discípulos à maneira de um guru. A relação de pai para filho ou de mestre para discípulo era em geral provisória, vindo ao término quando o discípulo havia alcançado suficiente maturidade espiritual para continuar seu próprio caminho por si mesmo na solidão.
O carisma dos padres do cenobitismo, de um Pacômio ou de um Basílio, por exemplo, era o de formular uma forma estável de vida comunitária, uma politeia, de acordo com uma regra estabelecida através da qual a experiência espiritual seria no futuro passada adiante. Achamos aqui uma autêntica cultura monástica que expressa uma identidade coletiva que capacita todos aqueles que dela participam alcançar sua própria identidade pessoal.
A cultura deve ser entendida aqui como um complexo coerente de ensinamento espiritual, tradições ascéticas, costumes, observâncias, organização administrativa, etc., que exprimem uma experiência espiritual, conservam-na viva e passam-na adiante. Uma cultura implica a coesão e consistência de todos os elementos da vida. Tal cultura é sempre, e por excelência, o fruto da experiência de uma coletividade. Um indivíduo não inventa sua cultura. O papel dos santos, místicos e gênios, assim como de poetas, artistas ou teólogos, é dar expressão à experiência que lhes foi passada e conservada viva através e na sua cultura.
No meio cenobítico, é essencialmente dentro e através da forma da própria vida comunitária que a experiência monástica é passada adiante e que a formação do monge se dá, desde sua entrada no mosteiro até que ele morra. São Bento está dentro desta grande tradição cenobítica e é aqui que os monges da tradição cenobítica devem buscar os princípios básicos da formação monástica e não numa espiritualidade com uma orientação eremítica.
Quando Bento, no primeiro capítulo de sua Regra, descreve as diferentes categorias de monges, define o poderosíssimo gênero dos cenobitas como aqueles que vivem a) em comunidade; b) sob uma regra; c) sob um abade. Temos aqui os três pilares do cenobitismo e a ordem na qual Bento os menciona é da maior importância. A história nos ensina que cada vez que o equilíbrio entre estes três elementos é quebrado, segue-se um período de decadência.
Comunidade, regra, abade. Estes são os três elementos essenciais da conversatio beneditina e é vivendo por eles em cada estágio de sua existência monástica que o monge gradualmente se torna um monge verdadeiro, e que sua formação - ou transformação - ocorre no sentido mencionado acima.
1) A comunidade
Na grande tradição beneditina e cisterciense, a vocação de uma pessoa não é um chamado a viver a vida monástica em geral ou mesmo a vocação a uma congregação particular. É o chamado a uma comunidade concreta de irmãos que constitui uma célula eclesial. É aqui que, após uma provação adequada, promete sua estabilidade; e é com estes irmãos, a menos que a obediência lhe dê outra missão, que ele experimentará o mistério de salvação na Igreja até o fim de seus dias.
A modalidade na qual cada comunidade concreta vive esta comunhão, esta koinonia, tem uma influência muito profunda sobre o desenvolvimento humano e espiritual do monge através de sua existência. Além de todos os "meios de formação" que oferece a seus membros, a comunidade como tal tem um papel da maior importância na formação.
Uma comunidade pode adequadamente cumprir este papel somente com a condição que tenha desenvolvido uma sólida cultura monástica local. Tal cultura monástica implica uma visão clara comum da vida monástica e uma orientação espiritual que condicione, que "informe" (no sentido aristotélico) todos os elementos da vida diária: o modo de rezar, de trabalhar, de tomar as decisões da comunidade, de receber os hóspedes etc.
Se tal visão comum, tal cultura existe, o papel dos "formadores" (abade, padre mestre, professores) consistirá essencialmente de ajudar os monges, antes de tudo os recém-chegados, participar nela e a permitir-se ser formados por ela, e fazê-la sua de modo responsável e criativo. Se isto não existe, todas as "técnicas" de formação que possam ser usadas (cursos, encontros, aconselhamento, etc.) terão, em geral, pouco resultado.
A comunidade monástica não é simplesmente um lugar onde nós praticamos a ascese pessoal. É um local onde buscamos a vontade de Deus juntos. Bento desejava que todos os irmãos fossem convocados sempre que algo importante tinha de ser discutido: convocet abbas omnem congregationem (RB 3:1), omnes ad consilium vocari (RB 3:3). Isto não é um simples exercício do poder da maioria, ou de democracia antes de seu tempo. Significa que todos devem se reunir para escutar o que o Espírito Santo está dizendo a cada pessoa para o bem de todas. Mesmo se é o abade que tem a responsabilidade final de tomar uma decisão, o capítulo conventual é a ocasião para cada pessoa exercitar um ato de co-responsabilidade comunitária e assim, crescer na compreensão de sua própria responsabilidade.
Uma comunidade sadia é também um lugar de crescimento emocional e afetivo. As relações pessoais que são capazes de se desenvolver no coração da vida comunitária são tanto uma escola que capacita uma relação profunda com Deus e uma expressão sacramental daquela relação. Uma vez que a comunidade cristã incorpora uma nova maneira de considerar as relações humanas, elas são vistas e vividas como uma expressão sacramental do mistério da Igreja. Estamos lidando com algo muito mais profundo do que um vago sentimento comunitário. Ainda assim deve-se tomar cuidado para não cair na armadilha de uma unanimidade muito estrita, que termina por privar os indivíduos de sua identidade pessoal.
A vida fraterna capacita as pessoas a se conhecerem a si mesmas nos encontros da vida diária e a descobrir a necessidade própria de conversão. Logo reconhecemo-nos a nós mesmos como uma comunidade de pecadores que foram todos perdoados. Esta vida fraterna dá também a possibilidade de ser transformado através da prática da caridade fraterna.
Uma vida comunitária sadia é o lugar onde podemos aprender a ler e a interpretar a realidade não só em nós mesmos mas também em torno de nós, e a penetrar no seu centro. Uma autêntica vida contemplativa não consiste em retirar-se da realidade para viver num mundo artificial ou puramente espiritual. Consiste em retirar-se para o centro, para o coração de toda realidade. Uma vida comunitária sadia nos ajuda a avaliar com serenidade a informação variada que recebemos, os diferentes acontecimentos através dos quais vivemos. Ajuda-nos a ir para além de nossas projeções subjetivas e nossos desejos conscientes ou inconscientes.
A inflexibilidade de posições e nas análises pessoais da realidade constituem em muitos casos um obstáculo que retarda o crescimento humano e espiritual. Um monge que continua a crescer normalmente na vida comunitária deve ser uma pessoa que sempre é capaz de se adaptar, de modificar suas opiniões e atitudes. Sabe que tem de lidar com os conflitos inevitáveis inerentes à existência humana e sabe como viver com paz de coração as tensões inerentes em toda vida comunitária. Uma vida comunitária sadia capacita-o gradualmente a adquirir uma atitude de compreensão, compaixão e simpatia para todos. Um monge que se transforma num caçador de heresias é um tanto anormal.
Na comunidade, o monge aprende a unificar sua vida. No mundo, uma pessoa pode facilmente viver numa série de vidas paralelas. Há por exemplo o homem de negócios, o profissional, ou o político, que conservam todos eles uma completa separação entre suas vidas profissionais e sua vida familiar ou entre sua vida profissional e sua prática religiosa. Para o monge, isto seria impossível. Um monge pode, em verdade, ter responsabilidades em sua comunidade e mesmo fora do mosteiro, mas todas as suas atividades formam parte de sua vida monástica, ele as faz como monge. De outro modo o elemento central do ser do monge estaria faltando, isto é, a simplicidade, que consiste em ter um único objetivo, uma única preocupação na vida.
2) A Regra
Cristo se fez obediente, com uma obediência através da qual sua vontade se identificou totalmente com a do Pai. É por este caminho de obediência, em imitação de Cristo, que o monge permitirá que o Espírito gradualmente restaure a imagem de Deus dentro dele. O que queremos aqui dizer é obviamente a obediência à vontade divina; mas esta obediência se encarna em toda ação da vida diária.
O Evangelho é a fonte de inumeráveis "formas de vida". Fez nascer numerosas maneiras de seguimento do Cristo. Os fundadores do cenobitismo receberam o carisma de uma interpretação existencial do Evangelho. Quando este carisma foi vivido de modo consistente dentro de um grupo, foi traduzido numa regra. Quando se entra numa comunidade cenobítica, torna-se parte de uma tradição, de uma interpretação viva do Evangelho. Escolhe-se livremente este "modo de vida" dentre muitos outros modos possíveis. Para Bento é tão importante que esta escolha seja feita de modo livre e claro que ele quer que sua Regra seja lida três vezes por inteiro ao candidato durante o ano que precede seu compromisso com a comunidade. É de fato esta Regra que, se vivida honesta e autenticamente, formará e transformará o monge.
A vida comum e a Regra que lhe dá estrutura são os meios para alcançar o amor de Deus no amor dos irmãos, preferindo o bem da comunidade à vontade própria; a vontade divina como expressa na Regra e colocada em prática nas situações concretas pelo superior para o bem de si. Da mesma maneira, a obediência mútua, da qual Bento fala, é vivida como um serviço e assim como um exercício de união de vontades que levam à pureza de coração e à visão de Deus.
A Regra, para o monge contemporâneo, não é só o texto de São Bento, mas também as Constituições próprias da Congregação monástica à qual ele pertence e os regulamentos escritos ou orais de sua comunidade local. Toda esta "legislação" não é uma simples "lei": é a expressão objetiva da identidade própria de uma comunidade ou de um grupo de comunidades. Assim como se adquire uma identidade cultural particular em permitir-se ser formado pela própria cultura ou em integrar-se numa outra cultura, da mesma forma ocorre em ser gradualmente formado por uma cultura monástica, integrando-se numa comunidade, e assim assumindo a visão particular daquela comunidade, desenvolvendo uma identidade monástica pessoal. O sinal de uma vocação verdadeira é a capacidade do candidato assumir deste modo a identidade coletiva de sua comunidade enquanto se torna mais e mais ele mesmo.
3) O Abade
Na tradição beneditina o abade, que representa Cristo em sua comunidade, é o pai espiritual, mestre e curador. Seu papel é obviamente muito diferente daquele dos superiores das comunidades religiosas com tradições mais recentes. Se é justo que seja um irmão entre irmãos, ele contudo não deve esquecer que foi chamado a ser um pai - não porque os outros devem ser como crianças ou adolescentes ante ele, mas porque tem a responsabilidade de fazer Cristo nascer neles.
Como um pai, o abade deve, por sua parte, mostrar a seus monges a gentileza e a bondade de Cristo, buscando ser antes amado do que temido, adaptando-se ao caráter de cada um e encorajando os irmãos a percorrer com alegria e com corações dispostos o caminho no qual eles foram chamados por Deus. O monge, por outro lado, deveria saber como conservar através de sua vida uma relação filial adulta em relação ao seu abade, quaisquer que sejam suas idades respectivas. Se ocorrer que um monge, depois da profissão, só vê em seu abade alguém a quem deve obedecer em assuntos realmente importantes, é provável que ele não esteja crescendo mais como monge (mesmo se tem uma grande aptidão humana e a usa para o bem da Igreja e da comunidade).
Não é raro, em nosso dias, que um noviço busque recriar no mosteiro a família que deixou para trás, ou que, em muitos casos, nunca teve, tendendo a identificar a figura paterna com autoridade e a figura materna com a comunidade. Tal atitude impede um crescimento verdadeiro pois consiste simplesmente em reproduzir o modelo familiar.
Se a relação entre o monge e o abade não for vivida numa maneira adulta e aberta, trará uma atitude passiva de insegurança e temor. A vida monástica implica uma separação de laços familiares. Laços de natureza semelhante não devem ser recriados no ambiente monástico. Uma comunidade deve ser um lugar de pessoas com um forte desejo de caminhar juntas para a vida eterna, e não um útero materno protetor. A sociedade hoje em dia infelizmente não nos prepara para esta relação sadia com a autoridade e a lei. Quer toda autoridade é negada, com uma séria falha de qualquer tipo de respeito, ou a segurança é buscada numa autoridade forte que decide sobre todos os assuntos.
Como mestre na escola de Cristo, o abade é o guardião da fidelidade dos discípulos à tradição monástica. Para que a regra e a tradição não se tornem letra morta, deve interpretá-las continuamente, de modo dinâmico. Alimenta seus monges pela palavra e exemplo. Dá-lhes a comer o pão da Palavra de Deus, interpretada para a comunidade a cada novo momento de sua evolução.
Como curador, deve curar de suas feridas e curar os irmãos feridos pelo pecado. Deve também ser um pai a quem se vai nos momentos de crise pessoal.
O abade é o pai, o mestre e o curador de todos os membros de sua comunidade. Mesmo se existe um mestre de noviços e um mestre de jovens professos, o abade não pode renunciar a seu papel de pai para eles. Nas comunidades modernas ativas, onde há um noviciado para uma província ou mesmo para toda a congregação, o noviço não tem outro superior imediato exceto seu padre mester; ele será designado a uma outra casa da congregação após sua profissão. Na vida beneditina, onde não se entra numa congregação mas num determinado mosteiro, o abade é o pai de todos, incluindo os noviços. Não pode renunciar às suas responsabilidade mesmo se delegar uma boa parte delas ao padre mestre.
Assim é essencial que exista uma visão comum entre o padre mestre e o abade. Se o padre mestre tenta formar uma nova comunidade diferente do resto da comunidade ou com uma orientação monástica diferente daquela do abade, seus esforços estão fadados quase certamente ao fracasso. O abade tem a responsabilidade última pela formação dos noviços como por todos os outros membros de sua comunidade. O padre mestre, seu delegado, simplesmente tem o dever de acompanhar os noviços mais de perto em sua caminhada monástica e proporcionar-lhes o necessário ensinamento no início de sua vida monástica.
A maturidade de um monge (noviço ou professo) depende numa grande extensão de sua capacidade de estabelecer uma relação sadia com a comunidade, a regra e o abade.

III. Os elementos principais da ascese monástica

Dentre os muitos elementos que constituem a conversatio monástica vivida em comunidade, sob uma regra e um abade, há três aos quais São Bento dá uma importância particular e que têm um especial valor formativo: o Opus Dei, a lectio divina e o trabalho. Mas ainda mais fundamental é o papel da Cruz na vida do monge.
1) Aprender a Cruz
O monge entra no mosteiro para seguir a Cristo, e retornar pelo caminho da obediência ao Pai de quem se separou pela desobediência (Prol. RB). Foi mediante o sofrimento que o próprio Filho de Deus aprendeu a obediência (Hb 5,8). Não há outro modo par ao cristão que deseja seguir a Cristo, e além disto Cristo é bastante explícito nos Evangelhos com relação às exigências de tal seguimento: "Quem quiser me seguir, renuncie a si mesmo, tome sua cruz e me siga."
É aqui que achamos a primeira atitude que deve ser encontrada em quem vem ao mosteiro. Está o candidato pronto a aceitar a Cruz? Então, durante os primeiros anos de vida monástica, deve ser guiado e ajudado a aceitar este caminho difícil. Bento deseja que previnamos o recém-chegado muito claramente, desde o início, das coisas duras e difíceis pelas quais se vai a Deus (RB 58,8).
Por vezes acontece que nossas comunidades tenham a triste experiência de ver um monge, que parecia excelente, deixá-la logo após sua profissão solene. Em quase todos os casos, o que faltava era esta formação na Cruz. O monge estava feliz na vida monástica enquanto achava agradáveis os arredores onde poderia florescer, onde seus talentos eram apreciados, onde desenvolvia suas capacidades, etc. Mas assim que ocorre uma tribulação séria, assim que encontra a cruz, tudo cai por terra.
Isto deve ser relacionado ao tema da inculturação. A verdadeira inculturação não consiste em integrar todas as atitudes que pertençam a uma cultura no Cristianismo ou na vida monástica; consiste em cristianizar cada cultura. O mistério da cruz salvadora pertence ao Cristianismo e desafia todas as culturas. Devemos aprender e reaprender este fato todos os dias.
Sem aceitar a Cruz, nenhum dos elementos da ascese monástica têm sentido. Mas se o monge a aceita com alegria, forma-lo-á por toda sua vida.
2) O Opus Dei
A oração monástica estritamente falando é a oração contínua. É preparada pela leitura, estudo e meditação sobre a Palavra de Deus; em comunidade é expressa no Opus Dei e abre-se para a lembrança da presença de Deus tão contínua quanto possível. O Opus Dei, além de ser uma expressão comunitária de oração, é também uma escola de oração. Lá o monge aprende continuamente, através de sua vida, a louvar a Deus, a chorar por seus pecados, a interceder ante Deus por si mesmo e por toda a humanidade, a contemplar todos os aspectos do mistério da salvação.
O Opus Dei não pode ser entendido, entretanto, fora do mundo sacramental em sua integridade enquanto o monge é conformado à imagem de Cristo na celebração eucarística, curado de suas feridas no sacramento da reconciliação, fortalecido a cumprir suas responsabilidades por várias bênçãos, e finalmente preparado a passar de modo positivo através das crises da vida e acima de tudo, para a última passagem pelo sacramento dos doentes.
3) Lectio (e estudos)
É interessante notar que na literatura cristã primitiva, ao menos até o tempo de São Bento, a expressão "lectio divina" sempre quis dizer a própria Sagrada Escritura e não uma atividade humana empreendida e que tenha a Escritura como seu objeto. Se alguém deseja traduzir esta expressão, deveria ser "lição divina" e não "leitura divina". A Sagrada Escritura não ensina o monge mas o transforma no seu contato diário com ela. Sua vida toda deve ser enraizada nesta lectio divina, nesta "lição divina" que ele lê, examina, estuda, interpreta e medita sem cessar, sem construir compartimentos estanques destas diferentes atividades. Se o monges se deixa gradualmente ser permeado pela Escritura, ela o forma, gradualmente fazendo dele um verdadeiro contemplativo, isto é, não necessariamente alguém que tenha o que se chama de experiências "místicas", mas uma pessoa que vê Deus em tudo e considera tudo à luz de Deus.
Deve-se saber como se desembaraçar de teorias contemporâneas que tornam a "lectio divina" um tipo de "leitura" especial e assim transformam-na numa observância dentre outras, mesmo se ela for considerada como a mais importante. Se a lectio divina é tornada uma atividade especial que deve ser realizada num tempo específico do dia e durante um período estabelecido, isto se torna mais uma observância que por isto mesmo perde a gratuidade que a caracteriza. Também se arrisca a esvaziar o resto do dia e das outras atividades da dimensão de atenção amorosa a Deus se se tenta concentrar nesta observância especial.
O monge deve aprender, desde o início de sua vida monástica, a escutar tão intimamente quanto possível a Deus. Deve deixar-se ser penetrado, desafiado, transformado pela Palavra de Deus que vem a ele à medida que ele lentamente lê e saboreia a Escritura, através de seu estudo científico da Palavra, através de sua leitura ou estudo dos Padres, através do seu trabalho e de seus encontros com os irmãos. Se o monge desenvolve esta atitude, parece artificial uma distinção muito marcada entre a lectio divina e o estudo da Escritura e dos Padres ou qualquer outra leitura. Tal distinção pode mesmo ser perigosa, pois leva à diminuição dos estudos.
O estudo tem seu lugar na vida do monge. Para que um monge viva direito sua vida monástica, ele necessita aprender muitas coisas. Como a Escritura é a Regra básica da vida monástica, como se disse, e a principal fonte da liturgia, o monge deve receber uma iniciação apropriada na Bíblia desde o início de sua vida monástica. Deve ser formado a ler a Escritura de modo contemplativo, mas deve também conhecer os principais Livros Sagrados, os diferentes níveis de interpretação, etc. Deve ser introduzido à tradição monástica, sua história e espiritualidade. Deve ter uma boa formação na doutrina cristã e ser introduzido aos Padres. Esta formação é necessária para todos, embora possa haver muitas formas diferentes. Em alguns mosteiros, quando há um grupo de noviços em que todos têm uma boa educação básica, esta formação pode ser dada através de um ciclo de cursos bem organizados. Noutros casos, o sistema tutorial pode ser julgado preferível. Alguns aproveitarão de uma abordagem científica enquanto outros acharão mais fácil uma abordagem mais simples. Nem todos têm as mesmas necessidades ou as mesmas capacidades intelectuais. Entretanto, deve-se saber como discernir a motivação dos candidatos que, muitas vezes nos dias de hoje, querem uma vida muito simples, "sem estudos". A sede de "aparições" e de acontecimentos extraordinários, que se acha em certas comunidades, muitas vezes vem de um conhecimento insuficiente do essencial da mensagem cristã.
Uma comunidade deve saber como estabelecer um programa de estudos que seja parte de seu programa geral de formação. Parte deste programa é realizada no noviciado e monasticado. O resto é estudado pelo resto da vida.
Um certo anti-intelectualismo, que pode ser achado em mais de um mosteiro hoje em dia, é talvez em parte uma reação, pois muitos "formadores" tinham uma tendência a tornar toda a formação monástica uma série de cursos. Por várias décadas agora, nas Ordens monásticas, os Padres do monaquismo têm sido muito estudados. Nós os ensinamos aos noviços e aos jovens professos. Não estou certo de que os resultados são sempre os que esperávamos. Por que isto?: Talvez porque damos aos jovens monges muito desta literatura antes que tenham adquirido uma identidade monástica que os capacite a assimilá-la no nível pessoal e a permitir-lhes ser formada por ela ao invés de estudá-la.
O padre mestre ideal seria um homem que, tendo assimilado perfeitamente a tradição monástica ele próprio, possa então fielmente passar seu conteúdo sem sequer ter de citar um dos padres do monaquismo. Tomemos um exemplo. Os Padres de Cister no século 12 que conheciam bem os Padres Gregos e Latinos, e foram formados por eles, nunca pareciam ter de "ensiná-los". Pode-se mesmo dizer que jamais ensinaram a Escritura, mesmo se a conheciam de cor, citavam-na constantemente e por vezes usavam o artifício literário de comentar um Livro da Escritura como modo de passar seu ensinamento espiritual. Eles passaram sua experiência viva. Os Padres, como a Escritura, revelam verdadeiramente seu segredo se eles são lidos dentro do contexto de uma cultura monástica que encarna os mesmos valores. Assim, mais uma vez, vemos a importância de desenvolver uma cultura monástica que incorpora todos os elementos da vida. E um deles é o trabalho.
4) Trabalho
Para São Bento, o trabalho é um elemento essencial da vida monástica. "Serão verdadeiros monges se viverem do trabalho de suas mãos" (RB 48:8). O trabalho, quer manual, quer intelectual, e em alguns casos, pastoral, é o contexto no qual a capacidade criativa ou a habilidade de colaborar com os outros e com Deus se torna evidente. O monge deve aprender a trabalhar seriamente no serviço da comunidade ou, em nome da comunidade, no serviço da Igreja e da sociedade.
O trabalho não preenche o papel de formar uma pessoa se é de caráter amadorístico ou se se torna, como facilmente ocorre, uma ocasião de busca de poder e de expressão da vontade própria.
Numa comunidade monástica, o trabalho tem tal impacto sobre a atmosfera geral da comunidade e afeta o equilíbrio em tal extensão que o abade não pode deixá-lo ao celeiro ou organizar a vida material da comunidade por si mesmo. É sua responsabilidade ver que o trabalho seja organizado de tal modo que contribua para o crescimento monástico dos monges, quer jovens, quer velhos.

IV. Os estágios de formação

Embora a formação seja um processo que dura a vida toda, como insistimos nas páginas precedentes, este processo ainda apresenta muitos estágios diferentes, cada qual com seus desafios, suas graças e seus problemas. Neste curto artigo, não podemos analisar cada um deles em detalhe, mas gostaríamos de ao menos enumerá-los e mencionar alguns de seus aspectos mais significativos. Há os estágios iniciais, quando o postulante e o noviço estão em grande necessidade de direção e de ajuda, ou quando o jovem professo tem muito a aprender. Há o período central da vida durante o qual cresce-se por meio das responsabilidades a que se dedica cada um na comunidade. Há também crises em cada período, e finalmente, a última crise da idade avançada e da morte. Mas em primeiríssimo lugar vem o período de discernimento da vocação antes da entrada à comunidade.
1) O período de discernimento
Não entramos num mosteiro para experimentar a vida, para ver se ele nos agrada ou se somos capazes de responder às suas exigências. Entramos para viver a vida monástica. Baseada numa experiência secular, a legislação eclesiástica introduziu diversos períodos sucessivos no compromissos monástico antes que um compromisso definitivo seja feito. Entretanto, se o candidato só vem para "ver" e não com a firme decisão de entregar-se completamente à vida monástica desde o início, tem pouca chance de permanecer.
Este é o motivo pelo qual o discernimento antes da entrada é tão importante. Aceitar candidatos sem este discernimento não é serviço a eles, nem à Igreja, nem à comunidade. Um discernimento sério é, ao contrário, um serviço à Igreja.
Quando alguém se apresenta ao mosteiro, devemos primeiro achar suas razões para vir. Em muitos casos, os candidatos não têm inteira consciência de seus verdadeiros motivos, e assim, devemos muitas vezes ajudá-los a discernir seus motivos por um tempo relativamente longo. Não é raro que alguém venha com um tipo de vocação "genérica" à vida religiosa ou mesmo à vida cristã. Ou talvez tenha tido uma súbita conversão e deseje se dar completamente a Deus; ou tenha recebido uma intensa graça de oração e deseje se consagrar a uma vida de oração; ou às vezes um sacerdote ou um religioso ativo engajados pesadamente no ministério que lhe deixa muito pouco tempo livre anseia pela oração contemplativa. Em todos estes casos, devemos ajudá-los a discernir se Deus realmente os está chamando à vida monástica ou se Deus não os está chamando a aprofundar os valores cristãos de que eles sentem grande necessidade na situação em que se encontram.
Outro aspecto do discernimento consiste em ver se o candidato possui a necessária capacidade de permanecer no certame que lhe é proposto: suficiente saúde física e psíquica, uma vida disciplinada ou ao menos uma capacidade para tanto, constância, etc. Aqueles que foram feridos pela vida de modo particular: infância infeliz, experiência sexual prematura e negativa, insucesso do casamento, etc., precisam de uma atenção especial. Se não desenvolveram já uma atitude positiva em relação a todos estes sofrimentos, o discernimento verdadeiro consistirá em ajudá-los a curar suas feridas o suficiente antes que entrem no mosteiro. Embora a comunidade monástica possa legitimamente ser considerada como uma comunidade terapêutica no sentido que nós todos fomos feridos pela vida, se não por nossos próprios pecados, e que a comunidade é uma situação normal para o crescimento humano, tanto psicológico quanto espiritual, é necessário um equilíbrio suficiente e saúde para ser capaz de tirar completo proveito dela. Alguns cujas feridas necessitam ajuda de um psicólogo profissional deveriam receber tal terapia antes de entrar no noviciado. Tal terapia requer toda a energia psíquica de uma pessoa, e o mesmo exige a formação do noviciado. As duas coisas raramente podem ser assumidas ao mesmo tempo.
Uma comunidade sólida com uma longa tradição monástica pode receber mais facilmente candidatos cuja vocação monástica ainda esteja em dúvida. O discernimento final pode facilmente ser feito vivendo a vida. Mas isto não é possível numa comunidade recente e pequena. Neste caso, a identidade da comunidade não é suficientemente estabelecida de tal modo a que um candidato possa rapidamente descobrir ou confrontar-se com ela, se ele está então no lugar certo ou não; e, por outro lado, a presença de um ou mais candidatos sem uma verdadeira vocação monástica forçará o padre mestre a dar tempo precioso a problemas que nada têm a ver com a vida monástica, e as vocações reais serão negligenciadas.
Entre os falsos motivos que levam alguém ao mosteiro, há em primeiro lugar, a busca de segurança material. É claro que aí se asseguram três refeições diárias e de um teto assim como dos serviços médicos necessários em caso de doença . Este motivo provavelmente não desempenhará um papel importante no caso de países do primeiro e segundo mundos, mas continuará a operar nas Igrejas Jovens. Parece-se como a busca de uma ascensão social.
Num tempo de grande insegurança em todos os níveis como o atual, não é raro que alguém venha ao mosteiro buscando segurança psicológica e espiritual. Nada há de errado nisto, se não é esta a motivação principal. Acima de tudo, devemos rapidamente ajudar os jovens a encontrar sua segurança numa relação de confiança com Deus e não no suporte artificial de estruturas rígidas e de observâncias antiquadas. Não deveríamos transformar nossos mosteiros em campos de refugiados culturais.
Uma grande parte da assim chamada literatura "espiritual" faz uma confusão infeliz entre "deixar o mundo" no sentido joanino, e voltar as costas contra a cultura de hoje. Se alguém vem ao mosteiro porque acha que o mundo está doente e é mau, e deseja deixá-lo para achar sua salvação no claustro, é melhor devolvê-lo ao mundo e ajudá-lo a amar este mundo doente, como Deus o amou. Só então deveria voar para o deserto, como o fizeram os Padres do Deserto, não por medo da luta, mas precisamente para lutar contra as forças do Mal que estão trabalhando não só no mundo em geral, mas também e sobretudo em seu próprio coração.
Algumas pessoas vêm ao mosteiro após ter dito a experiência de um tipo particular - carismático ou outro - da comunidade cristã com uma espiritualidade particular e um sentimento muito forte de fraternidade. Em princípio esta pode ser uma excelente preparação para a vida comunitária, mas por vezes acontece que isto cria problemas, se a "vida comunitária" é identificada come sta forma particular. Estas pessoas então acham que não existe "vida comunitária" na comunidade em que entraram, pois não encontram a mesma intensidade de companheirismo coletivo que conheceram anteriormente. Há uma intensidade de relacionamento fraterno que pode ser experimentada em encontros de fins de semana mas que não se perpetua todo o tempo sem dar indigestão.
O mesmo princípio pode ser aplicado às várias formas de oração que alguém possa ter experimentado antes de sua entrada no mosteiro. Há por vezes o perigo de identificar a "oração" com uma ou outra destas formas. Um sinal de vocação será a capacidade de assumir um estilo de oração tipicamente monástico: isto é dizer o Opus Dei por um lado e uma oração pessoal nutrida pela lectio divina, por outro.
2) Postulantado
Mesmo se isto não está explicitamente previsto pelo Direito Canônico (canon 5972, embora fale da preparação adequada antes da entrada no noviciado), muitas comunidades têm um postulantado, um período de tempo que pode variar bastante de acordo com o costume.
Infelizmente, contudo, este postulantado tem sido muitas vezes usado para ensinar os elementos da doutrina cristã (que deveriam ter sido ensinados antes da entrada) ou para iniciar o ensinamento do noviciado. Isto tira do postulantado seu próprio caráter peculiar como importante momento de transição.
A entrada no mosteiro é, de fato, um momento importante na vida de uma pessoa. Marca a transição de um estilo de vida a outro. Esta transição se inicia por uma separação física e afetiva das atividades e dos relacionamentos pessoais nos quais a identidade pessoal do candidato foi em grande extensão construída até aquele momento. Se ele teve a graça de uma vida familiar feliz e muitos amigos, esta separação é ainda mais profundamente sentida.
Uma vez que ele deixou uma forma de vida sem estar completamente integrado noutra, é normal que o postulante experimente um sentimento de alienação, isto é de não pertença, e sinta um vazio profundo, e por vezes, uma espécie de frustração. Trata-se de um tempo de morte e ressurreição em que é confrontado com o significado de todas as suas experiências prévias, de tudo aquilo pelo qual se tornou a pessoa que é agora, de todos aqueles que deixou e que continua a amar (família, amigos etc.)
O padre mester deve estar consciente de tudo o que os postulantes estão experimentando neste momento. Mas seria um grave erro privá-los deste tempo de ‘luto’. Atravessar este luto da maneira mais adequada e consciente é da maior importância para o resto da vida monástica. Seria um grave erro preencher estes primeiros dias - e mesmo todo o postulantado - com inúmeras atividades, encontros, conferências para "encher" o tempo dos postulantes. Seria privá-los da possibilidade de conscientemente fazer esta passagem através do deserto.
O postulantado, desta maneira, não deveria ser um tempo em que alguém ministra cursos e conferências, exceto aquelas estritamente necessárias para integrá-los na vida diária da comunidade. É um tempo de acostumá-los gradualmente a viver na vida monástica. O postulantado deveria ser uma descoberta da nova "situação" na qual ele agora vive, da comunidade, a Regra e o abade.
3) O noviciado e o monasticado
Embora o discernimento vocacional continue durante o noviciado, não se trata em primeiro lugar de um tempo de discernimento, uma vez que se aceita no noviciado aqueles em que se acredita ter já discernido uma vocação monástica. Trata-se de um tempo de crescimento e de amadurecimento, sob a direção de um mester: crescimento no conhecimento e aceitação de si mesmo, crescimento nas relações comunitárias, crescimento acima de tudo no relacionamento pessoal com Deus.
Para levar a cabo isto dever-se-ia ajudar o noviço a aprofundar sua vida de oração, e a nutrir-se com a Palavra de Deus. Gradualmente é colocado em contato com a grande tradição monástica e com o ensinamento dos grandes mestres espirituais para ajudá-lo a definir sua própria identidade espiritual.
O monasticado com freqüência visto somente como tempo de estudo, pois este tem necessariamente um papel importante, é em primeiro lugar, o tempo em que o jovem monge se enraíza na comunidade pelo início do exercício de alguma responsabilidade, e quando se prepara para o compromisso definitivo.
Não nos demoraremos sobre estes dois importantes períodos da formação inicial, o noviciado e o monasticado, pois são o objeto de muitos estudos especializados.
4) Crises
No início da vida monástica, o noviço tem geralmente um sentimento de bem-estar pessoal. Não é raro ouvir alguém dizer que durante seu noviciado nunca se sentiu tão bem em toda sua vida. Mas também ocorre que, mesmo durante o noviciado, ou alguns anos depois, o sofrimento emirja da consciência de problemas pessoais que se pensava resolvido muito tempo antes e agora aparecem com uma nova intensidade. Se, durante estes primeiros anos fica-se constantemente imerso nos estudos ou em outras atividades agradáveis, esta "crise" pode ocorrer muito mais tarde. Pode ocorrer agudamente depois da profissão solene ou, no caso de monges sacerdotes, pouco depois da ordenação.
Estes problemas pessoais são diversos. Pode ser que a sexualidade esteja insuficientemente integrada ou desorientada. Pode ocorrer que feridas psicológicas advenham do contexto de uma família de alcoólatras. Pode se dar por um temperamento difícil ou imprevisível ou por alterações súbitas de humor, etc. O silêncio e a solidão do deserto monástico, a falta de suporte humano, e a grande dificuldade de conservar uma máscara indefinidamente na vida comunitária tornem possível a estes problemas sua emergência.
Obviamente, não estamos lidando aqui com problemas exclusivos da vida monástica. No mundo eles provavelmente se tornam evidente um por vez e serão talvez resolvidos por uma carreira com sucesso, auxílio psicológico ou a terapia de um bom casamento. No mosteiro, não é raro que se tornem evidentes todos juntos. Este é o momento em que se vê se a casa foi edificada sobre a rocha ou sobre a areia (Mt 7,25).
Se a vida comum favorece a erupção de tal crise, o contexto de uma comunidade sadia também oferece os meios pelos quais possa esta ser experimentada de modo positivo, com a graça de Deus, o discernimento do pai espiritual e o suporte dos irmãos. Toda passagem a um novo estágio de crescimento implica uma espécie de desintegração positiva da personalidade que precisa, então, ser reconstruída numa nova base. Muitos estados que hoje seriam considerados como depressão nervosa (e tratados como tal) são provavelmente este tipo de crise: chamadas ‘noites escuras’ na linguagem dos místicos, oferecem a chance de um salto qualitativo no crescimento humano e espiritual. Este é o elemento mais essencial da formação contínua, enquanto o último é com freqüência identificado com "reciclagens’ periódicas.
Finalmente, uma comunidade monástica precisa estar particularmente atenta em socorrer cada um de seus membros na passagem serena através da grande e última crise, que ninguém pode evitar, e que põe o selo do Espírito em sua configuração a Cristo.

Conclusão

De acordo com a Regra de São Bento, o recém-chegado ao mosteiro é formado pela vivência da vida comunitária. Este é o motivo pelo qual é confiado a um monge maduro, cheio de discernimento e de zelo pelas almas, cujo papel essencial é descobrir se ele é diligente nos elementos da vida monástica que antes de todos os outros devem formá-lo: a oração da comunidade, a obediência e as humilhações.
Esta é a maneira da formação que a vida monástica nos oferece para atingir aquela liberdade de coração que nos capacita a correr com os corações alargados no ardor da caridade no caminho dos mandamentos divinos e atingir, com a graça de Deus, uma completa transformação na imagem do Cristo no dia do Encontro.

Traduziu: Cecilia Fridman, Rio Negro, PR, Brasil, para o Mosteiro Trapista Nossa Senhora de Novo Mundo.

FONTE: Ecclesia.com.br

Gileno Diniz

Fiel Amigo de Jesus

Devemos sempre e incondicionalmente amar a Jesus, o Cristo e servir a sua Igreja!.

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